Reconhecimento contábil da receita sob o viés internacional e a realidade local.

Autores

  • Cláudio Marcelo R Cordeiro

Resumo

O propósito principal deste artigo é demonstrar a forma de reconhecimento contábil das diversas modalidades de receita, a luz da realidade local, e em conformidade com padrões internacionais de contabilidade. Embora pareça ser simples o processo de reconhecimento de uma receita na contabilidade, com a adoção de padrões internacionais de contabilidade este reconhecimento passou a ficar muito mais criterioso. Tínhamos no Brasil, e muitos ainda acreditam que é assim, o hábito de reconhecer a receita na emissão na nota fiscal, independentemente de eventos posteriores à venda. Em linha com a IAS 18 Revenue, e o CPC 30 Receitas, para que exista o reconhecimento de uma receita, 5 etapas devem ser verificadas pelo responsável pela escrita contábil da entidade, sendo estas: 1º. A entidade tenha transferido para o comprador os riscos e benefícios significativos inerentes à propriedade dos bens; 2º. A entidade não mantenha envolvimento continuado na gestão, em grau normalmente associado à propriedade, nem controle efetivo sobre os bens vendidos; 3º. O montante de receita a ser reconhecido possa ser mensurado de maneira confiável; 4º. Exista a possibilidade de que os benefícios econômicos associados à transação serão gerados em favor da entidade; 5º. As despesas incorridas ou a serem incorridas, referentes à transação, possam ser mensurados com confiança. Analisando estas premissas, não basta simplesmente reconhecer uma receita pela emissão da nota fiscal, pois poderá ter uma série de riscos associados à venda, que impediriam, pelo menos do ponto de vista da boa técnica contábil, do seu reconhecimento imediato. Uma venda realizada na modalidade de frete CIF cost, insurance and  freight, onde o frete é pago na origem, ou seja, no preço da venda estão incluídos o custo da mercadoria, o seguro de transporte que garante a mercadoria e o frete de transporte até o destino, o vendedor assume o risco da transação, até o produto chegar ao destino final. Imaginemos uma venda realizada no dia 30/12, de Curitiba, com transporte terrestre, para o interior da Bahia, que leve em média 4 dias para chegar ao destino. Será uma receita reconhecida na emissão do documento, 30/12, ou somente no dia 03/01 do ano seguinte, quando efetivamente o produto chegar ao destino final? Entendemos que seguindo o rigor da norma, enquanto o vendedor detiver um risco em suas mãos, a venda não deve ser reconhecida contabilmente, principalmente na modalidade de frete CIF, pois a obrigação de entrega permanece com a entidade que vendeu. Neste caso, a contabilização mais prudente seria reconhecer um passivo, pois somente poderia ser reconhecida na demonstração do resultado, a partir da entrega e do aceito pelo comprador. Outros fatos agregados de uma transação desta natureza devem ser de pleno conhecimento do responsável pela escrituração contábil, para saber o momento oportuno do reconhecimento da receita. Ainda nesta mesma transação, poderia ter uma condição contratual no momento da venda, que o vendedor se compromete a instalar o produto vendido na fábrica do comprador, testá-lo, até deixá-lo pronto para utilização. Em uma situação assim, o reconhecimento pode delongar mais de um mês da data da emissão da nota fiscal de venda, e naturalmente durante todo este período, não há o que se falar em receita, e sim em obrigações registradas no passivo. A pergunta que não que calar, seria: E os impostos da venda, ocorrerão na emissão do documento, ou no reconhecimento da receita? Neste caso, devemos levar em consideração quais impostos nos referimos, pois se falarmos principalmente do ICMS e do IPI, muito provavelmente serão exigidos na emissão do documento. Em relação a IRPJ e CSLL, podem ser polêmicos, entretanto o fato gerador é faturamento, no lucro presumido e no simples nacional, e somente se houver lucro, quando o regime é o lucro real, ou seja, estes tributos serão devidos quando há o registro da receita na demonstração do resultado. Como a legislação fiscal de cada país pode interferir diretamente na forma de reconhecimento da receita, o IASB International Accounting Standards Board, orientou o momento oportuno do reconhecimento para itens específicos, tais como: Vendas em consignação: A receita é reconhecida pelo remetente, não pelo beneficiário, quando s bens são vendidos a terceiros. Os bens em consignação permanecem como propriedade do consignador e são incluídos no seu estoque. Vendas a intermediários, como distribuidores, comerciantes ou outros revendedores: Normalmente a receita é reconhecida quando os riscos e benefícios de propriedade foram transferidos. Na hipótese do comprador agir como um agente, a venda é tratada como uma venda em consignação. Vendas de assinaturas de publicações: A receita é reconhecida em base linear durante o período em que os itens são remetidos, de acordo com o contrato de prestação de serviços. Vendas parceladas: A receita é reconhecida pelo valor presente do pagamento, descontando-se as parcelas a receber pela taxa de juros imputada na transação. Venda de imóveis: A receita da construção de um imóvel é reconhecida dependendo da existência de um acordo de venda dos bens, a prestação dos serviços, ou contrato de construção. Na contabilidade ainda podem existir outras modalidades de receitas, não tão comuns, todavia também tem o seu momento oportuno de reconhecimento, destacando-se os juros, royalties e dividendos. De acordo com Almeida (2014) os juros representam rendimentos auferidos pela entidade em função de terceiros utilizarem seus recursos de caixa e equivalente de caixa, ou de quantias devidas para a entidade. Os juros devem ser reconhecidos utilizando-se o método da taxa efetiva de juros, conforme descrita no CPC 38 – instrumentos financeiros. Os royalties representam rendimentos ganhos pela utilização por parte de terceiros de ativos de longo prazo da entidade, como, por exemplo, patentes, marcas, direitos autorais e softwares de computadores. Os royalties devem ser reconhecidos pelo regime de competência, de acordo com a essência do contrato pactuado entre as partes. Dividendos representam ganhos com ativos de ações, em função dos emissores das ações distribuírem lucros aos detentores desses instrumentos patrimoniais. Os dividendos devem ser reconhecidos quando for estabelecido o direito do acionista de receber o respectivo valor. Ao longo deste artigo procuramos caracterizar o momento oportuno do reconhecimento dos diversos tipos de receitas na contabilidade, além de apresentarmos situações práticas que o profissional da contabilidade poderá se deparar no seu cotidiano, desmistificando que a receita sempre deve ser reconhecida pela emissão do documento fiscal, realidade recorrente no Brasil.

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Publicado

2023-03-22