INFRAÇÕES E ILÍCITOSTRIBUTÁRIOS

Autores

  • DENILSON CESAR SENA

Resumo

Pretende-se neste estudo abordar os diferentes tipos de infrações e, as espécies de natureza de ilicitude tributária, tratando-se de classificar o regime jurídico aplicável. Auxiliando os interessados sobre o assunto a compreender melhor as diferenças entre os ilícitos e as penalidades aplicáveis a cada caso concreto. Ives Gandra da Silva Martins denomina de infrações e ilícito tributário, sem entrar na controvérsia sobre o rótulo a ser utilizado, para designar situações onde o sujeito passivo da obrigação tributária, seja na condição de contribuinte ou, responsável realiza um comportamento, deixando de cumprir determinada obrigação ou dever instrumental. Ainda, registra Hugo de Brito Machado que, saindo do campo do ilícito  acaba por caracterizar um ilícitotributário. Observando-se os comportamentos juridicamente relevantes que, o sujeito passivo da obrigação tributária realiza, deixando de cumprir a lei, “infração”, realizando um comportamento previsto como ilícito, “ao contrário de lícito”. A  verdade é que a lei prescreve sanções que, além de não se enquadrar como sendo uma obrigação tributária, “comportamento consistente em levar compulsoriamente dinheiro aos cofres públicos”, as conseqüências das sanções se sujeitam aos regimes jurídicosdiversos. Por exemplo, o deixar de cumprir obrigação principal no prazo, além dos juros de mora, a lei tributária prevê a multa de mora e correção monetária. Quando o contribuinte deixa de cumprir uma obrigação acessória ou dever instrumental formal, acarreta como conseqüência, se o dever a cumprir, por exemplo, era a entrega dadeclaração de imposto de renda, além da possibilidade do sujeito ativo efetuar o lançamento de ofício, prevê a lei tributária a aplicação de uma multa por infração de caráter meramente formal. Ainda, a lei tributária prescreve a possibilidade de interditar o estabelecimento comercial, apreender mercadorias etc., como decorrência do exercício do poder de polícia, mas também como sanção decorrente de norma tributária. Há previsões de situações onde o comportamento omissivo ou comissivo do sujeito passivo da obrigação, com previsão expressa em lei, caracteriza verdadeiros crimes contra a ordem tributáriaque, se enquadram como verdadeiras normas do Direito Penal em seu sentido estrito. Por isso entende-se ser relevante está abordagem considerando-se a existência de multifárias situações, consideradas como caracterizadoras  de  infrações ou ilícitos tributários, sujeitos a diferentes regimes jurídicos, somente com  a análise da situação típica e, à luz do regime jurídico aplicável poderá levar à correta solução  jurídica doproblema.   1.1 INFRAÇÕES E ILÍCITOS DE NATUREZACIVIL Quando o contribuinte ou profissional depara-se com um ato administrativo que, o Direito Tributário denomina de lançamento, conforme dispõe o art. 142 do Código Tributário Nacional, este ato complexo que o Direito Tributário nomeia de lançamento, como afirma o referido artigo citado, contém em um único instrumento, uma obrigação principal, a “tributária”, decorrente do não pagamento do tributo. Essa obrigação principal, “não tributária” que é a multa, pelo descumprimento de obrigação acessória, penalidades de caráter pecuniário, tais como: a multa, juros de mora, correção monetáriaetc. Segundo  Yoshiaki Ichiharao correto enquadramento, seja da     obrigaçãoprincipal tributária ou as penalidades concretamente aplicadas, quando analisadas aluz dos critérios e dos princípios, considerando o regime jurídico, aplicável, poderá levar a uma solução juridicamente correta. Enquadrando-se entre as infrações e ilícitos de natureza meramente civis, as multas de mora, os juros moratórios, a correção monetária etc., geralmente calculados como acessórios da obrigação principal. Com efeito, tais sanções de natureza meramente civis, já que são  acessórios do principal, “obrigação tributária”, diante do que já diziam os romanos, acessorium  suiprincipalisnaturamsequitu,  na  observação  destas infrações,sobre o principal, que é a base, a análise deverá ser efetuada com a aplicação de normas e, princípios de Direito Tributário e no que  se  refere às multas de mora, juros de mora etc., que aparecem como acessórios, considerando-se as infrações de natureza meramente civis, aplicando as regras e princípios de Direito Privado. Ainda na visão de Yoshiaki Ichihara, considerando-se a origem das penalidades aplicadas, sob o aspecto formal decorrentes de ato administrativo, são elas: legitimidade, cumprimento de formalidades, prazos etc., a observação deverá ser feita à luz das regras e dos princípios de Direito Administrativo. Exemplificando-se a afirmação acima, os juros de mora, a multa de mora ou a correção monetária, se o principal for objeto de remissão como o “perdão ou dispensa de tributo”, evidentemente, os acessórios calculados com base no principal também desaparecerão, pois zero multiplicado por X% será sempre igual a “zero”. Todavia, quando se fala em aplicação dos juros de mora, não será o previsto no Código  Civil,  os  0,5%  (cinco  por  cento)  mas,  o  previsto  no  Código    TributárioNacional, disposto no art. 161, inc 1o, 1% (um por cento). Com referência a correção monetária, que tanto se aplica aos débitos de natureza estritamente civis, como aos créditos da Fazenda Pública, entende-se não se caracterizar como uma penalidade, plus, lucro ou prejuízo, mas um mecanismo, objetivando-se preservar um princípio de direito, visando-se evitar que uma parte enriqueça sem causa em prejuízo da parte contráriaSobre a natureza da correção monetária já decidiu o E. Tribunal: A correção monetária não constitui parcela que se agrega ao principal, mas simples recomposição do valor e poder aquisitivo do mesmo. Trata-se, apenas, na verdade, de nova expressão numérica do valor monetário aviltado pela inflação. Quem recebe com correção monetária não recebe um plus, mas apenas o que lhe é devido, em forma atualizada (JTA 109/372) 1.2 INFRAÇÕES E ILÍCITOS DE NATUREZAADMINISTRATIVA   Em alguns casos como se comentou anteriormente, mesmo que as penas sejam decorrentes de infrações civis, considerando-se o ato administrativo da imposição, aplicam-se as regras e princípios de Direito Administrativo, o que decorre da unicidade do Direito. Yoshiaki Ichihara prescreve que existem infrações de caráter meramente administrativo, como as multas aplicadas por infração meramente formal, por exemplo: pela falta de inscrição do estabelecimento nas repartições competentes, falta autenticação prévia dos livros fiscais, falta de entrega de informativos econômicos etc., que se poderia enquadrar como infrações e ilícitos tributários denatureza administrativa. O mesmo se observa em relação às penalidades de interdição de estabelecimentos, apreensão de mercadorias etc., que podem ser enquadrados como sanções decorrentes de infrações de caráter administrativo. Com efeito, para se questionar tais penalidades, se enquadradas como de natureza administrativa, os fatos deverão ser analisados à luz dos critérios que informam as regras e os princípios de Direito Administrativo, como o mínimo indispensável para se concluir uma solução juridicamente correta. Um modelo de argumento que o Prof. Hugo de Brito Machado aponta, quando a infração formal resultar no não recolhimento do tributo, por exemplo, a aplicação da multa por infração meramente formal, com a imposição de penalidade proporcional ao tributo não recolhido, será ilegal, por configurar inadmissível bis in idem.   1.3 INFRAÇÕES E ILÍCITOS DE NATUREZAPENAL   As infrações e ilícitos de natureza penal, tendo como sujeito passivo, idêntico ou da obrigação tributária, são as infrações previstas no Código Penal ou na legislação específica, como é o caso da Lei n. 8.137/90. São, na realidade, infrações que se caracterizam como penais no seu sentido estrito, podendo as penas ser privativas da liberdade, de multa e de restrição de direitos, conforme preconiza o dispositivolegal. Ressalte-se, ainda, que legislar sobre as matérias estritamente penais compete exclusivamente à União, nos termos do art. 22, I, da Constituição Federal de1988. Contudo, diversas são as normas de Direito Penal constantes no Código Penal que, poderão caracterizar ilícitos concomitantes com a matéria tributária. Os dispositivos legais são: art. 171, “estelionato”; art. 298, ”falsificação de documentos”; art.168,” apropriação indébita”; art. 334, “contrabando e descaminho”, art. 329, ”resistência”, art. 330, “desobediência”, art. 331 “desacato”, dentre outros. Saliente-se, neste aspecto, que existem na legislação esparsa, inclusive nas leis federais que instituem tributos, verdadeiras normais penais estritamente consideradas e, no passado houve normas específicas como as Leis nºs 4.502/64, 4729/64, 5.569/69, etc., cujas matérias foram abrangidas pela Lei n. 8.137/90, de 27- 12-1990, denominada de crimes contra a ordem tributária. Está legislação tipifica e prescreve como crimes tributários o conteúdo dos arts.1o., 2o e 3o da Lei n. 8.137/90, como preconiza os dispositivos legal abaixo: Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo,  ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:   I       - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;   II      - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela leifiscal;   III     - falsificar ou alterar nota fiscal,fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operaçãotributável;   IV    - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ouinexato;   V      - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.   Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.   Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.   Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:   I   - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento detributo;   II    - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofrespúblicos;   III    - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivofiscal;   IV    - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;   V    - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita  ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à FazendaPública.   Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.   Art. 3o. Constitui crime funcional contra a ordem tributária, além dos  previstos no Decreto-Lei no. 2.848, de 07 de dezembro de 1940 – Código Penal (Título XI, CapítuloI):   I – extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento, de que tenha a guarda em razão da função; sonega-lo, ou inutiliza-lo, total ou parcialmente, acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social;   II-exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou, antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para  deixarde lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou  cobra-los parcialmente..   Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.   III-patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração fazendária, valendo-se da qualidade de funcionário público.   Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.   Como se vê, a lei que define os crimes contra a ordem tributária, tendo como destinatário o sujeito passivo da obrigação tributária, além de extensa, envolve as seguintes situações, tais como:   [...] omitir informações, prestar declaração falsa; fraudar a fiscalização, inserindo ou omitindo dados; falsificar ou alterar documentos, tais como a nota fiscal, duplicata, fatura, etc.; utilizar, elaborar ou fornecer documento falso ou inexato; negar ou fornecer documento obrigatório, como é o caso  da notafiscal.   Todos estes comportamentos relacionados acima, tipificam os crimes previstos no art. 1o. da Lei nº 8.137/90, com penas que variam de 2(dois) a 5 (cinco) anos de reclusão e multa. Por sua vez, Yoshiaki Ichihara em sua obra Crimes contra a ordem tributária, e também em um Simpósio coordenado por Ives Gandra da Silva Martins preceitua que: O comando principal “[...] suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório [...]“ é que caracteriza o “Crime contra a ordem Tributária”,  por  meio  das  condutas,  ações  ou  meios,  consistentes  em:    omitirinformação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operações de qualquer natureza; falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata etc.; elaborar, distribuir, fornecer ou utilizar, sabendo ser falso ou inexato; negar ou deixar de fornecer, nota fiscal, ou documento equivalente, quando obrigatório. Pedro Roberto Decomain acerca desta assertiva preceitua que, combinando o comando contido no caput com as condutas previstas nos itens I a V, do art. 1º da Lei nº 8.137/90, não se trata de crime de mera conduta, mas trata-se de crimesmateriais ou de resultado, onde o dano é elemento essencial . Complementando a idéia acima, o doutrinador ainda manifesta-se: O núcleo dos crimes previstos no artigo 1o. da lei está nos verbos suprimir e reduzir, inseridos em seu caput. Trata-se, portanto, de crimes materiais ou de resultado. É preciso que através das práticas previstas nos incisos do artigo 1o. ocorra a supressão ou redução de algum tributo, para que o  crime esteja caracterizado, ao menos em sua forma consumada. Suprimir tributo significa aqui deixar inteiramente de pagar montante devido a tal título. Reduzir tributo quer dizer pagar importância menor do que a efetivamente devida.   Por sua vez, Antônio Correa analisando o art. 1º da Lei nº 8.137/90, afirma que não se trata de crime de mera conduta, sem resultado naturalístico; formais, de evento naturalístico cortado ou de consumação antecipada e materiais  de resultado. Damásio E. de Jesus classificando e entendendo que há crimes de mera conduta, “sem resultado naturalístico”; formais, “evento naturalístico cortado ou de consumação antecipada” e, materiais “de resultado”. Ainda complementa a idéia o doutrinador acima:     Distinguimos os crimes formais do de mera conduta. Estes são sem resultado; aqueles possuem resultado, mas o legislador antecipa a consumação à sua produção. No crime de mera conduta o legislador só descreve o comportamento do agente. Exs.: violação do domicílio (art. 150), desobediência (art. 330) e reingresso de estrangeiro expulso (art. 338). No crime formal o tipo menciona o comportamento e o resultado, mas não  exige a sua produção para consumação. Exs. Crime contra a honra, ameaça, divulgação de segredo, violação de segredo profissional etc. No crime material o tipo menciona o evento, exigindo a sua produção para a consumação. Exs: Homicídio, infanticídio, aborto, participação em suicídio, lesão corporal, furto, rouboetc.   Por sua vez, no crime material há necessidade de um resultado externo à ação, descrito na lei. Esse resultado dever ser entendido no sentido naturalístico e não jurídico, pois este último, todos os delitos contêm, como se pode observar noscrimes de homicídio, “morte”, furto ou roubo, ”subtração”, sedução “desvirginamento”, etc. Já no crime formal, não há necessidade da ocorrência do resultado naturalístico, pois o legislador antecipa o momento consumativo do crime. No delito de ameaça, conforme dispõe o art. 147, a consumação a prática do fato, independentemente da reação psicológica do ofendido etc. Contudo, no crime de mera conduta não existeoresultadonaturalístico, contemplando-se a lei com a simples atividade, “conduta”, do agente. Exemplos dessa espécie são: o ato obsceno, conforme dispõe o art. 233 e, a violação do domicílio como preconiza o art. 150,etc. Ainda,  no  art.  2o   relacionam  os  comportamentos  que  constituem  crimescontra a ordem tributária, por exemplo: “[...] deixar de recolher tributo ou contribuição no prazo legal; deixar de aplicar incentivos; divulgar programas de processamento  de dados que permitam fornecer informações diversas da prevista em lei etc.”, com penas que variam de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos de detenção emulta. Entende-se, outrossim, que a conduta deixar de recolher ICMSdeclarado,por exemplo, tipifica o crime previsto na Lei nº 8.137/90, apesar de se observar um entendimento contrário da jurisprudência. Por sua vez, nos crimes praticados por funcionários públicos. “[...] o extravio de documentos; exigir, solicitar ou receber vantagem indevida; patrocinar interesse de particulares, também denominada de advocacia administrativa”, aparece como integrantes dos crimes contra a ordem tributária, previsto no art. 3º da Lei nº 8.137/90.

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Publicado

2023-03-22