GUERRA DOS PORTOS: INÍCIO DA REFORMA TRIBUTÁRIO NO BRASIL OU A CONCENTRAÇÃO DE INDÚSTRIAS NO ESTADO CONSUMIDOR?

Autores

  • Flávio Gruba

Resumo

“Eu hoje acordei querendo ver o mar, mas eu moro bem no meio de uma selva de pedra” (Armandinho). Então, vamos aos tributos: o Brasil iniciou a reforma tributária e usou como pano de fundo o fim da guerra dos portos com a edição da Resolução número 13, de 25 de abril de 2012, do Senado Federal. Destaca-se, antes de mais nada, que compete ao Senado Federal, conforme determina a Carta Maior, ou seja, a Constituição Federal de 1988, a determinação das alíquotas  interestaduais de ICMS, que é o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação. Sendo assim, usando essa competência prevista na Constituição Federal, o Senado aprovou a Resolução de número 13, determinando uma alíquota interestadual de 4% para os produtos importados, independentemente da localidade do produto importado. Destacando que a regra não se aplica para produtos produzidos com processo produtivo básico (PPB), tendo em vista que as regras já estão definidas nas Leis de número 8.248/91 e 8.387/91, para esses produtos, um exemplo seriam os produtos de informática. Lembrando que estão excepcionados à regra o gás natural importado e produto sem similar nacional. O início de vigência da alíquota de 4% para os produtos importados foi em 01 de janeiro de 2013. As regras e definições do que é um produto importado foi regulamentado atualmente no Convênio ICMS nº 38, de 22 de maio de 2013. Como regra geral, as alíquotas interestaduais de ICMS são definidas da seguinte forma: 1)    Operações interestaduais do Sul e Sudeste para o Sul e Sudeste a alíquota é de 12% (doze por cento), exceto Espírito Santo; 2)    Operações interestaduais do Sul e Sudeste para o Norte, Nordeste, Centro Oeste e Espírito Santo a alíquota é de 7% (sete por cento); 3)    Operações interestaduais do Norte, Nordeste, Centro Oeste e Espírito Santo para o Sul e Sudeste a alíquota é de 12% (sete por cento); 4)    Operações com produtos importados a alíquota interestadual é de 4% (quatro por cento), conforme regras previstas na Resolução nº 13/12; [71] Tendo em vista que para toda regra existente uma exceção, um exemplo é o serviço de transporte aéreo interestadual de passageiro, carga e mala postal, que está sujeito a alíquota de 4%. Neste texto, não pretendo abordar todas as exceções do ICMS, mas resumir algumas situações que propiciem a compreensão da situação. A partir dessa breve introdução, pretendo apresentar um tema que vem sendo amplamente discutido no Brasil, a famosa “reforma tributária”. Na mesma linha, não pretendo fugir ao tema, mas um dos precursores do código tributário nacional, Lei número 5.172/66 (CTN), Alfredo Augusto Becker, já comparou a situação do Brasil a um “manicômio jurídico tributário”, ideia da qual não comungo somente em relação ao termo utilizado: manicômio, complementando que, as coisas mais complexas de se entender são os tributos, a morte e as mulheres, essas ao menos de forma profunda, restando mistérios ainda a desvendar. Sendo assim, voltando ao tema, a Resolução 13 foi apenas o início da pretendida reforma tributária. O governo federal pretende ampliar a regra da alíquota de 4%, em todas as operações interestaduais e para todos os produtos, acabar com os incentivos fiscais concedidos de forma unilateral pelos Estados em determinada escala de tempo e regulamentar as operações de comércio eletrônico quanto às vendas pela internet. Atualmente, o ICMS é totalmente devido na origem, necessitando aprovar uma divisão também com o Estado de destino. A reforma tributária pretendida está prevista no Projeto de Resolução do Senado (PRS) de número 1, de 2013, em debate no Senado. Para viabilizar a aprovação desse PRS, o Governo Federal editou a Medida Provisória de número 599, de 27 de dezembro de 2012, que pretendia financiar os Estados para acabar com os incentivos fiscais. Entretanto a Medida não foi aprovada e perdeu sua eficácia, mas pode ser ressuscitada em outra Medida Provisória, assim que o for aprovado. Destaco também que foram várias tentativas de alíquotas de ICMS Interestadual para aprovação do PRS, inclusive mantendo exceção para o gás natural importado, mas sem um acordo efetivo até o momento. O consenso está difícil de ser alcançado, tendo em vista que o Norte e Nordeste entendem que a alíquota interestadual não deve ser uniforme no Brasil em 4%, e que precisam de uma alíquota maior, acordada atualmente em 7%. De outra sorte, há o Estado do Amazonas, que tem a Zona Franca de Manaus, com vários incentivos fiscais, a exemplo: Imposto de Importação, Pis e Cofins, IPI, inclusive de ICMS, quer uma alíquota diferenciada do resto do Brasil, ou seja, manter 12%, sendo negociada uma possibilidade de reduzir para 10%. Caso mantida uma alíquota diferenciada para Manaus, tendo em vista que passará um crédito de ICMS maior de que outros Estados (12 ou 10%), poderá ocorrer uma espécie de “Corrida do Ouro”, porém gerando também aumento em vários custos, como aluguel, mão de obra especializada, etc., devido à crescente demanda, além do já conhecido que é o frete até os grandes centros consumidores,  neutralizando assim a vantagem inicial. Conforme regra atual, os incentivos fiscais deverão ser aprovados no CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária). Por outro lado, os Estados concederam incentivos fiscais para atrair empresas para seus Estados, entretanto a maioria dos incentivos fiscais não foram aprovados no CONFAZ. Portanto, convivemos com os incentivos fiscais “ilegais”, que alguns Estados tentam combater, com ADIS (Ação Direta de Inconstitucionalidade), mas de forma incoerente, os mesmos concedem incentivos fiscais “ilegais”. Em linhas tortas muitas vezes é possível escrever reto, é o que aconteceu com os incentivos fiscais, que apesar de “ilegais” ajudaram o Brasil a criar uma política de desenvolvimento industrial, descentralizada, principalmente de São Paulo. A indústria automotiva é um exemplo que expandiu para outros Estados, como Paraná, Minas Gerais, Manaus, etc. Da mesma sorte, a indústria de informática, que expandiu além de Manaus para São Paulo, Bahia, Paraná, etc. Sendo assim, atualmente existe um certo equilíbrio em níveis de descentralização e que ao avançar pode desafogar os grandes centros, que estão insustentáveis do ponto de vista de trânsito, poluição, violência, bem como outros males da vida moderna. E enfim, comprometendo a famosa qualidade de vida que buscamos até o fim terreno. Validar os incentivos fiscais é uma etapa inicial e necessária para que ocorra a reforma tributária no país. Ao estabelecer alíquota de ICMS interestadual de 4% ou 7% para todos os produtos pode-se levar as empresas, ou pelo menos as grandes empresas, no caminho inverso, ou seja, à concentração nos grandes estados consumidores, principalmente São Paulo, gerando desemprego nos demais Estados. A consequência pode ocorrer por vários motivos, sendo que primeiramente sem os incentivos fiscais muitas empresas têm seus custos onerados, quando distantes do consumidor, a exemplo do frete. Outro ponto agravante é de que a grande maioria dos produtos no Brasil estão sujeitos às regras de substituição tributária ou antecipação tributária, em resumo, o ICMS é pago na primeira etapa da cadeia até o consumidor final. Mas para executar o cálculo da Substituição Tributária nas operações interestaduais deve ser calculado o MVA ou IVA (margem de valor agregado ou índice de valor adicionado) de forma ajustada, fixo nas operações internas, portanto quanto menor a alíquota interna em relação à interestadual, maior será esse MVA, consequentemente maior será o ICMS para o Estado de destino, criando assim uma barreira interestadual, em comparação com uma operação interna, conforme veremos no quadro, com alíquota interestadual de 4%: Observar nesse exemplo que as mercadorias produzidas e vendidas no mesmo Estado têm uma vantagem de 18,42% em relação a uma operação interestadual. Nesse caso, muitas empresas não tem essa margem de lucro para colocar no preço, não restando alternativas de mudar para o Estado consumidor ou fechar as portas. Abaixo, outro exemplo, com alíquota interestadual de 7%, demonstrando também um impacto no ICMS de 14,47%:

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Publicado

2023-03-22